Evaldo Balbino
Os
três poderes do nosso país, em qualquer uma de suas partes e de seus patamares,
causam inveja em qualquer circo. E quando olhamos para os altos patamares
desses poderes, aí sim um Cirque du
Soleil fica no chinelo. Perde o seu brilho solar, porque o ouro do
poder (com olhos grandes de cifrões) fala mais forte. Espero que se entenda
aqui essa comparação, pois o brilho da arte do Cirque du Soleil é inapagável. Só que em termos de malabarismo, no
mau sentido da expressão, a política brasileira se sobressai.
Li
ontem na Carta Capital sobre uma
sombra que rodeia o presidente em exercício Michel Temer. Trata-se de um jantar
no Jaburu em 2014, onde o então vice-presidente promoveu um encontro para
captação de fundos de campanha. Além do anfitrião Temer, participaram desse
festim, num espaço público e com recursos públicos, os convivas Eliseu Padilha
(hoje chefe da Casa Civil), Marcelo Odebrecht (presidente da Odebrecht condenado
a 19 anos de cadeia pela Lava Jato) e Cláudio Melo Filho, ex-lobista dessa
empresa.
O
encontro era segredo. Não de estado, mas de “amigos” cujas mãos “se ajudam” nos
bastidores. Era segredo, mas não é mais. Foi justamente Melo Filho, em delação
premiada, que primeiro atirou ao vento as principais linhas da trama ocultista
que se operara nesse jantar e depois dele.
Para
detalhes dos desencontros entre os fatos, declarações que não se casam, meneios
dos discursos que tentam sair pela porta dos fundos numa hesitação que
demonstra culpa no cartório, remeto o leitor à excelente reportagem “O
presidente assombrado”, assinada por André Barrocal (Carta capital, 05 de abril de 2017, p. 16-21).
Na
mesma reportagem, lê-se que o julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral da
chapa Dilma-Temer está previsto para o dia 04 de abril de 2017, terça-feira. Percebe-se
que, apesar de a revista que tenho em mãos ter vindo às bancas agora, na semana
do dia 04 de abril, a redação da reportagem é da semana anterior. Já vemos nessa
reportagem, como em qualquer texto arguto e comprometido com a política de
nosso país, o que podemos chamar de quase profecia: “Boatos em Brasília indicam
ainda que o julgamento poderá ficar inconcluso por meses, graças a manobras
regimentais”. Ora, pois não foi isso o que aconteceu justamente ontem, dia 04
de abril? O TSE deu mais prazo para as defesas e suspendeu o julgamento, que
poderá ser retomado somente em maio.
Nada
mais providencial, para o Palácio do Planalto, do que essa decisão. Mas não nos
enganemos: acasos não existem. A suspensão do julgamento ocorre no exato
momento em que dois dos sete ministros estão prestes a deixar o TSE, pois seus
mandatos na Corte se encerram um no próximo dia 16 de abril e o outro em 5 de
maio. Os dois novos ministros, por lei, serão indicados pelo presidente em
exercício. Provavelmente, então, os dois novos julgadores do presidente Temer
serão os escolhidos por ele.
O
que se pode esperar dum processo presidido por Gilmar Mendes, escancaradamente
íntimo dum réu a quem cabe julgar – Michel Temer? O que se espera dum
julgamento cujos dois novos julgadores serão escolhidos justamente pelo próprio
e mesmo réu? O que se espera desse baile que se realiza nos altos do Olimpo?
Os
deuses vão fazendo malabarismos, barganhas, conchavos, trocando cetros e
poderes. Enquanto isso, o povo a tudo assiste (ou não assiste) do outro lado,
mais abaixo das montanhas que o separam do Olimpo.
Aliás, pensando assim, me lembro bem dum povo, lá em 1984, brigando nas ruas por “Diretas já” e o congresso votando o contrário. Lembro-me de pessoas em 2016 enfrentando forças policiais de fora da Câmara dos deputados, enquanto estes (do outro lado e protegidos por uma parede intransponível de vidro) brindavam com suas taças e comiam de lautas mesas uma fartura vinda de dinheiro público. Alguns deputados e funcionários da Casa até tiveram tempo para tirar fotos dos confrontos lá de fora. Talvez quisessem confeccionar cartões-postais da linda e excludente cena proporcionada pela política brasileira.
Aliás, pensando assim, me lembro bem dum povo, lá em 1984, brigando nas ruas por “Diretas já” e o congresso votando o contrário. Lembro-me de pessoas em 2016 enfrentando forças policiais de fora da Câmara dos deputados, enquanto estes (do outro lado e protegidos por uma parede intransponível de vidro) brindavam com suas taças e comiam de lautas mesas uma fartura vinda de dinheiro público. Alguns deputados e funcionários da Casa até tiveram tempo para tirar fotos dos confrontos lá de fora. Talvez quisessem confeccionar cartões-postais da linda e excludente cena proporcionada pela política brasileira.
© 2017 Evaldo Balbino
Excelente!
ResponderExcluirObrigado, Luciana! Que bom que você gostou. Um forte abraço.
ExcluirBelíssimo texto, Evaldo. Já te conheço como literato, celebro, agora, tua participação política nesse momento tão crucial da sociedade brasileira.
ResponderExcluirDe fato, caro Francisco, não devemos nos calar. O silêncio, muitas vezes, é necessário; outras, não. Chega a ser perigoso. Um forte abraço.
ExcluirSó mesmo a ironia nos pode salvar.
ResponderExcluirSim, Renata. A ironia, a poderosa ironia! Um forte abraço.
ExcluirAdoro seus textos....hoje revisitei para iniciar rindo gostoso....estava precisando.....
ResponderExcluirQuerida Maria Generosa, muito grato por sua visita. Um forte e amigo abraço!!!
ExcluirÉ professor, dizem que aqui, tudo termina em pizza! Justiça? só para pobres e descamisados. E o jeitinho brasileiro, de onde terá vindo? dos altos escalões do Olimpo ou da massa ávida por sobreviver? Obs. Ramoel... sou eu José Leomar de Brito - curso de capacitação ambiental de 2014, que queria se dedicar a escrever livros. Entrei na fileira dos escritores...já vou seguindo.
ResponderExcluirOi, José Leomar, tudo bem? De fato, aqui tudo (ou quase tudo) acaba mesmo em pizza. Mas Vamos lutando, né?! E escrever é um modo de lutar. Abraços grande para você. Ah, e continue sim escrevendo. torço por você. Abraços.
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