Michel
Temer foi denunciado anteontem pela Procuradoria Geral da República – PGR.
Acusação: corrupção passiva. O Código Penal, em seu artigo 317, define tal
crime como sendo o de "solicitar ou receber, para si ou para outros,
direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em
razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.
Devido
a isso, o presidente cancelou ontem sua agenda no Planalto para defender-se
mais uma vez. No vídeo que gravou, supostamente para o povo brasileiro, ele acusou
o delator Joesley Batista, o ex-procurador da República Marcelo Miller (que
deixou o Ministério Público Federal – MPF – para atuar em um escritório de
advocacia que negociou o acordo de leniência do grupo JBS) e, sem nomear, acusou
também o atual procurador-geral Rodrigo Janot.
Buscando
culpar delatores, advogados de delatores e acusadores, Michel Temer tenta, mas
não consegue, tapar o sol sombrio com a peneira. É que os furos da peneira que
ele usa já são grandes demais. E os fachos de sombra que a atravessam são
nítidos. Escancarados, porque escancarada já está a podridão na política brasileira.
O nosso presidente busca de todos os modos vedar uma sepultura delatora, e para
isso usa os poderes que lhe estão disponíveis, inclusive os do cargo público que ora ocupa. Mas
não adianta: o cadáver já está putrefato. Só não sente o mau cheiro quem não
tem bom senso.
Sem
aqui colocar a mão no fogo por outrem, pois não se quer arriscar que ela se
queime, afirmo que o presidente busca infrações nos referidos alvos para tentar
se livrar dos pesos que lhe imputam culpa e ingovernabilidade. Na luta incessante
pela autodefesa, nenhum governante consegue governar.
E
mais ainda, não consegue governar, no caso de Temer, porque já perdeu a
credibilidade segundo a opinião da maioria dos brasileiros. Basta vermos as sérias
pesquisas destacando nos últimos dias a voz do povo que, segundo a tradição, é
a voz de Deus. Se isso nem sempre é verdade, pelo menos às vezes é assim mesmo.
O
mais interessante na autodefesa de Michel Temer é vê-lo enxovalhando pessoas
com quem, até outro dia mesmo, ele se relacionava em conversa clandestina no
Palácio do Jaburu, e isso na calada da noite. O homem a que ele hoje chama de “senhor
grampeador” (o que é verdade) é o mesmo que lhe confidenciava crimes, perante os
quais ele assentia como um bom companheiro. Pois todos nós sabemos: o atual presidente,
pela gravação que não sofreu nenhuma adulteração segundo laudo da Polícia
Federal, foi conivente com um criminoso. E isso no exercício de suas funções presidenciáveis.
O provérbio popular “Dize-me com quem andas e direi quem és” carrega consigo
equívocos, pois tudo na vida é relativo. No caso de Temer, porém, esse
provérbio é plenamente cabível.
Um
presidente pode sim receber e ouvir a todos no seu palácio, conforme o próprio acusado
fez questão de dizer aos quatro ventos logo após a divulgação da sua conversa
gravada com o empresário Joesley Batista. No entanto, daí a ouvir crimes e nada
fazer, já é demais. Houve, por certo, conivência, o que já é crime. E se existe
algo mais, cabe à justiça averiguar.
No
vídeo de ontem, depois da denúncia protocolada pela PGR, Temer proferiu uma
linda pérola, tão falsa como seu governo. Soltou um comentário de fazer os ouvidos
rirem. “Tenho orgulho de ser presidente. Convenhamos, é uma coisa
extraordinária. Para mim é algo tocante. É algo que, não sei como Deus me colocou aqui,
dando-me uma tarefa difícil, mas certamente para que eu pudesse cumpri-la...”.
De fato, depois dessa fala tão cômica, o locutor em tela virou piada nas redes
sociais. Agora um golpe parlamentar, baixo e de bastidores nem tão escondidos
assim, mudou de nome; virou Deus.
De uma coisa tenho certeza, Temer: com Deus é
que não andas! Pelo menos não no teu papel de presidente.
© Evaldo Balbino 2017